terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Terapia

Na minha família, são muito raros os casos de doença cardíaca. Tanto do lado paterno, como materno, não houve muitos infartos, mortes súbitas, e mesmo a hipertensão ("pressão alta") é de baixa incidência. Em compensação, casos de câncer (nos mais variados órgãos) e doenças psiquiátricas (das mais variadas, também, e graus) existem para encher compêndios de Medicina.
Não me preocupo com o câncer, porque tenho confiança de que saberia reconhecer a maioria dos sintomas que eu possa ter, mas a doença psiquiátrica sempre foi pessoalmente temida. Porque não estudei muito essa área, e a linha entre o normal e o patológico, nela, é mais difícil de ser demarcada. Imagino que até para os profissionais da área deva ser algo difícil, em alguns casos.
Por exemplo, aquela paixão de tirar o fôlego, em que você pensa na pessoa da hora que acorda até a hora que fecha os olhos para dormir, a sua mania de lavar as mãos, ou seu desejo de se exercitar até desenhar os músculos já viraram transtornos obsessivos compulsivos? Essa tristeza sem explicação, vontade de não levantar da cama já pode ser rotulada como depressão? A pessoa vai prá Vegas e perde mais dinheiro do que deveria, Está em fase de mania, numa doença bipolar? Tem comportamentos que são claramente "sair da casinha", mas tem coisa que é questionável. Tem gente que é só esquisitona, não esquizoide ou esquizofrênica. Eu nem me atrevo a diagnosticar... Deixo para os psiquiatras, mesmo.
É diferente de dor física. Dor é dor, não é normal a pessoa subir uma ladeira e sentir um aperto no peito. Então, prá mim, é muito mais fácil rotular e tratar de doenças do corpo, do que da alma. Por inclinação, escolha, treino e dedicação, esta é a minha praia. Claro que a gente vê o paciente como um todo, tenta levar em consideração o aspecto emocional da doença, etc. Mas eu gosto de prescrever medicação/encaminhar para cirugia, quando bem indicada, mais do que tratar na base de comunicação verbal. Os resultados são mais imediatos.
Então, devido ao histórico da família, sempre me vigiei. Principalmente na fase dos filhos bebês, com a privação de sono, o medo da depressão pós-parto foi muito real. Mas era só dormir que os sintomas passavam, então fui tranquilizada pela minha mãe a respeito.
Eu tinha um preconceito grande quanto à psicoterapia. Achava que "terapia" implicava "tratamento", e que, então, seria indicada para pessoas com doenças/distúrbios/desajustes. Como, de uma maneira geral, sempre me senti equilibradinha, passando pelos problemas e situações da vida sem maiores traumas, apesar de alguns terem sido bem pesados, nunca me vi frequentando uma.
Porém, após o divórcio, encarando uma situação não esperada, uma grande amiga minha me sugeriu que eu fosse, e outra me indicou uma psicóloga. Uma das melhores coisas que me aconteceram nesse processo doloroso todo, e um dos melhores investimentos que já fiz e ainda faço!
Os benefícios que a psicoterapia trazem são inúmeros! Eu tinha a ideia de que seria alguém prá desabafar, algo não muito diferente do que o que a gente faz com amigos. Isso acontece, sim, mas não para por aí. A psicóloga escuta, sumariza, interpreta, dá a opinião dela (que às vezes é um ponto de vista que você sequer considerou), (raramente) sugere uma estratégia, uma solução, conduz a sua linha de raciocínio, alinhava as suas palavras, desembaraça as suas ideias, desafia, assegura que o que você está sentindo é normal/válido/esperado (se for), demonstra preocupação se não for, encaminha ao psiquiatra se necessário... e muito mais. Na maioria das vezes, você está passando por uma experiência que para você é única, ou a primeira vez, mas ela geralmente já viu vários casos parecidos, estudou muito das teorias a respeito do comportamento humano, tem muito mais segurança. Mesmo porque não está com aquela inundação de sentimentos (muitas vezes contraditórios), ou seja, no meio do furacão, como você. E, o mais lindo: se você não está preparado para perceber o que para ela é óbvio, por ser profissional e estar vendo de fora, ela espera você chegar lá. E o conduz de uma maneira amorosa e paciente, lidando com a sua reação quando você enxergar (o que às vezes você evitou com todas as forças, inconscientemente).
Bem, só fazendo para saber do que eu estou falando. Ajuda muito. Mesmo.
Um amigo meu me disse que não confia em terapia, porque acha que ninguém é tão equilibrado a ponto de poder ajudar outra pessoa em questões emocionais. Discordo completamente. Eu trato de uma enxaqueca crônica, e isso não me impede de tratar uma angina pectoris de um paciente. Ninguém é totalmente saudável, nem fisica, nem emocionalmente. Isso não é premissa para ser um bom profissional da saúde. Todo mundo tem seus traumas, assuntos mal resolvidos, em graus diferentes de boa ou má administração. Concordo que, pelo tipo de troca que existe entre psicólogos/psiquiatras e seus pacientes, talvez eles tenham, também, que fazer terapia, se vigiar, manter a estabilidade emocional para poder trabalhar melhor. Mas qual profissão não precisa disso?
Acredito que todas as pessoas deveriam se dar a chance de experimentar a psicoterapia, num momento em que sentissem a necessidade. Existem coisas que não se consegue enfrentar sozinho. Não conheço ninguém que tenha tido a experiência, com um bom profissional, e não tenha se encantado. Independente de diagnóstico médico, ou não. Que profissão linda! A pessoa certa na área certa sempre é uma felicidade, mas, na área da saúde, convenhamos, é uma bênção prá quem se serve dela.

OBS: com um abraço carinhoso para Yvogmar Palauro, Adriana Tabai e Jussieu Siqueira

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